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A obra científica de A. J. Ferreira da Silva e a sua memória familiar são revisitadas com o respeito e admiração que merecem. Analisam-se criteriosamente aspetos relevantes do seu percurso científico na Academia Politécnica do Porto e no Laboratório da Câmara Municipal do Porto. Citam-se os seus amigos fundamentais nas atividades realizadas, em particular no que concerne à Sociedade Portuguesa de Química. A inteligibilidade da Química segundo Ferreira da Silva é realçada.
Ao relembrar António Ferreira da Silva (FS), não recordamos apenas um cientista; celebramos um arquiteto da ciência moderna, cujos alicerces de conhecimento confiável ainda ressoam até hoje. Figura-maior da química moderna em Portugal, um visionário do século XIX, moldou a química como uma ciência e um pilar da dignidade social em Portugal. Ao tecer os padrões de consenso, método, provas, valores e humildade, FS estabeleceu a química como a “ciência confiável”, uma força transformadora na sociedade. Urge refletir FS como um (verdadeiro) influenciador social, que entrelaçou a química com os desafios científicos e sociais contemporâneos. Desafiando o status quo, FS não se limitou a avançar na ciência; lutou contra informações falsas, interpretações legislativas incorretas e promoveu a institucionalização da química. Cruzando a história da ciência com a atualidade, pretendo mostrar como os princípios de FS permanecem tão relevantes hoje, quanto eram há um século. Uma reflexão necessária para compreender a química como vetor de mudança social, um espelho da nossa humanidade.
O Laboratório de química analítica Ferreira da Silva, instalado no edifício histórico da Universidade do Porto e recentemente requalificado, evoca uma figura incontornável da Química portuguesa: António Joaquim Ferreira da Silva (1853-1923), lente na Academia Politécnica e professor na Universidade do Porto, cofundador da Revista de Chimica Pura e Applicada e da Sociedade Chimica Portugueza. Dirigiu o Laboratorio Chimico Municipal, criado por iniciativa camarária e onde, numa ótica de prestação de serviços à comunidade, se desenvolveram trabalhos de investigação nas diferentes áreas da análise química que o projetariam internacionalmente. A sua autoridade científica e pedagógica permitiu-lhe reivindicar uma área significativa dos novos espaços do edifício da Academia para a instalação de um amplo laboratório de ensino quando surgiu a necessidade de assegurar a realização de análises requeridas por processos judiciais após o encerramento do Laboratorio Municipal em 1907.
No processo de abastecimento de água potável à cidade do Porto, na década de 1880, foi solicitado o contributo da química analítica para avaliar o potencial de potabilidade do recurso a explorar, o rio Sousa. António Joaquim Ferreira da Silva (1853-1923), então um jovem lente de química da Academia Politécnica, respondeu ao desafio. Em 1881, iniciou, assim, a sua primeira experiência significativa de colaboração com instituições externas à Academia. Essa experiência foi além das análises e relatórios, em face das contestações à concessão. Recebeu algumas críticas, que o obrigaram a defender-se. Revelou-se um polemista eficaz. O presente artigo procura delinear a intervenção de Ferreira da Silva no contexto de implementação do sistema.
A avaliação da autenticidade do Vinho do Porto tem sido, ao longo da sua longa história, uma preocupação constante de todo o setor envolvido, com um conhecimento muito aprofundado da sua composição e dos determinantes enológicos que estão envolvidos na sua produção. Desta forma, este artigo procura resumir alguns dos inúmeros contributos da ciência, em articulação com entidades oficiais (com relevância para o Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto, IP) para a garantia da autenticidade do Vinho do Porto nas últimas décadas. Todo este volume de informação produzida a partir de uma grande diversidade de técnicas analíticas tem contribuído para dar continuidade e honrar o inestimável legado científico deixado pelo Professor Ferreira da Silva, desde que, no final de séc. XIX e início do século XX, ajudou a desbloquear um embargo económico aos vinhos portugueses pelas autoridades Brasileiras da época, a partir de informação veiculada pela investigação científica levada a efeito.
Neste trabalho é referida a importância das Sociedades Científicas, criadas um pouco por todo o mundo científico no pós-Renascimento cultural europeu dos séculos XV-XVI para o desenvolvimento e promoção da cultura científica. Particulariza-se com o caso da criação da Sociedade Portuguesa de Química, num tributo singelo de homenagem especial a A. J. Ferreira da Silva (1853-1923), Professor de Química no Laboratório Químico da Academia Politécnica do Porto, integrado, em 1911, na Universidade do Porto.
A Revista de Chimica Pura e Applicada (RCPA) é a primeira revista de química portuguesa e a sua criação, em 1904, muito deve ao impulso e determinação do Professor António Joaquim Ferreira da Silva, figura maior da química portuguesa e primeiro Presidente da Sociedade Portuguesa de Química (1911), de quem se celebra o centésimo aniversário do seu falecimento. A RCPA teve uma vida longa, de mais de meio século (1904-1958), tendo passado a ser, a partir da criação desta, um órgão institucional da Sociedade de Química Portuguesa. Da sua missão originária, e continuada, foi servindo a construção da memória coletiva, através de diferentes tipos de publicação, artigos científicos, culturais e informativos, reuniões da Sociedade, evidenciando polémicas científicas, relatando e dando notícia sobre eventos do mundo científico, nacional e internacional. Apresentam-se algumas notas sobre a leitura da mesma.
Ferreira da Silva (FS) revolucionou a química e a cultura científica portuguesas. Da mesma forma que, nas palavras de Roald Hoffmann, Marie-Anne Lavoisier mereceria uma ópera, a vida de Ferreira da Silva merece um filme ou, pelo menos, uma peça de teatro. Relembrando factos que repousam em vários números da Revista de Chimica Pura e Applicada (RCPA), destaca-se a defesa do seu Templo contra os Zoilos infiéis e o paradigmático discurso proferido na sessão da abertura solene da Universidade do Porto, em 1911, demonstrando que Ferreira da Silva estava muito à frente do seu tempo: “Sejamos modestos e benevolentes; porque não podemos formular, nas ciências que mais apaixonadamente cultivamos, construções a que possamos dar o carácter dogmático; sejamos moderados e discretos nas nossas afirmações”. Carlo Rovelli assinaria por baixo.