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Série II / Número 147 / Volume 41
Dezembro 2017
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DOI: 10.52590/M3.P682

Neste número do QUÍMICA dá-se destaque a dois grupos de produtos naturais: os hidratos de carbono e os flavonoides. Ambos ocorrem naturalmente, sobretudo nas plantas e nos seus frutos e, por isso, integram diariamente a nossa dieta. A compreensão das funções destes compostos nos alimentos, nomeadamente as suas propriedades biológicas e organoléticas, é, portanto, essencial. 
Os hidratos de carbono são sintetizados pelas plantas, por fotossíntese, onde desempenham, fundamentalmente, funções estruturais e de reserva de energia. Aliás, os hidratos de carbono são, juntamente com os lípidos, uma das principais fontes de energia dos seres vivos, estando os animais e os microrganismos não fotossintéticos dependentes das plantas. Os hidratos de carbono têm também um papel relevante nas propriedades organoléticas dos alimentos, sendo, por exemplo, responsáveis pela sua doçura. Quanto aos flavonoides, alguns são considerados particularmente benéficos para a nossa saúde, atuando como antioxidantes e estando associados à prevenção de vários tipos de doenças, nomeadamente cardiovasculares e cancro. Os flavonoides contribuem para as cores das plantas e frutos, desde os amarelos das calconas aos vermelhos, azuis e violetas das antocianinas. Em muitos casos são os responsáveis pela cor e sabor (adstringência e amargor) dos alimentos e bebidas.
As funções dos hidratos de carbono nos alimentos, bem como o seu papel no sistema imunitário, ou o uso de polissacarídeos na produção de filmes para aplicações alimentares, são temas discutidos em artigos aqui publicados e que resultaram de convites a alguns dos oradores no GLUPOR12 (12.ª Reunião do Grupo de Glúcidos), que decorreu em setembro em Aveiro. Agradeço ao meu colega Prof. Doutor Manuel Coimbra pela sua valiosa ajuda na seleção dos investigadores a convidar e na avaliação científica dos manuscritos submetidos. 
A cinética e termodinâmica das antocianinas, bem como a descoberta das piranoantocianinas, são discutidas num artigo–entrevista do Prof. Doutor Fernando Pina, que aproveito para felicitar pela sua recente Jubilação. Noutro artigo são abordados alguns métodos de síntese de flavonoides não-naturais (naftilcromonas) com potencial farmacêutico. Merecem igual destaque dois artigos de história da ciência, um dedicado a Francis Crick e outro ao Laboratorio Chymico da Universidade de Coimbra.
Desejo a todos Festas Felizes e um excelente 2018.

 


Reuniões do Conselho Executivo da EuCheMS e Assembleia Geral de 2017

O Conselho Executivo da EuCheMS reuniu três vezes  durante o ano de 2017 (em fevereico, em Frankfurt, na sede da Sociedade Alemã de Química (GDCh), em junho, em Liverpool, e em setembro, em Roma), sendo que a última reunião foi seguida da Assembleia Geral que ocorre anualmente

​Nomes dos elementos 113, 115, 117 e 118 da tabela periódica

No primeiro fascículo do Química de 2017 (vol. 41, nº 144,  pp. 11-14) foi publicado um artigo contendo algumas reflexões sobre os nomes dos elementos 113, 115, 117 e 118 da tabela periódica dos elementos químicos.

 


- 11th International Conference on the History of Chemistry, Trondheim – Noruega
- Congresso EUROANALYSIS 2017 (19th edition)
- MACC_17: Methods and Applications in Computational Chemistry
- International Symposium on Synthesis and Catalysis (ISySyCat2017)
- Reunião anual da Divisão de Química Verde e Sustentável da EuCheMS
- Congresso bianual de Química Verde e Sustentabilidade (3EUGSC)
- XXII Olimpíada Ibero-Americana de Química 2017
- Prémio Nobel da Química 2017


Anthony J. Burke é Professor Auxiliar com Agregação no Departamento de Química da Universidade de Évora e coordenador científico de uma das linhas de investigação do Centro de Química de Évora da mesma Universidade. Licenciou-se em Química e Biologia na Universidade Nacional da Irlanda (Maynooth)


Neste artigo–entrevista é feita uma introdução à cinética e termodinâmica das antocianinas, a fim de enquadrar a importância da descoberta das piranoantocianinas. Segue-se uma entrevista a Paulo Cameira dos Santos, responsável científico pela primeira publicação onde se referem estes compostos, que revela interessantes pormenores históricos dessa descoberta.

 


Considerando o elevado número de doenças ainda sem cura ou com tratamentos pouco eficazes, tornase cada vez mais urgente descobrir novas moléculas para tratar essas patologias. A síntese de compostos híbridos, tendo como base produtos naturais, é uma estratégia que pode dar origem a fármacos mais eficientes. As naftilcromonas são exemplos desse tipo de híbridos, sendo obtidas por combinação de duas classes importantes de compostos: as flavonas e os naftalenos. As flavonas, um subgrupo dos flavonoides, têm atividade biológica comprovada. Por outro lado, os naftalenos são compostos com uma potente atividade antimicrobiana, sendo eficazes contra uma ampla gama de agentes patogénicos.


Na indústria alimentar os hidratos de carbono desempenham funções importantes, nomeadamente como adoçantes, espessantes, gelificantes, agentes de estabilização e de emulsificação. Para além destas funções, a interação que alguns polissacarídeos apresentam com outros compostos alimentares tem levantado a hipótese de eles poderem ter outras funções na indústria alimentar, como por exemplo na modulação de adstringência. Uma interação importante de alguns polissacarídeos, como as pectinas e a xantana, ocorre com os polifenóis. 
Os polifenóis são conhecidos pelos seus benefícios importantes para a saúde. No entanto, os produtos alimentares ricos em alguns polifenóis, especialmente antocianinas e taninos, podem apresentar desafios para a indústria alimentar em relação às suas propriedades organoléticas, como a estabilidade da cor em bebidas ricas em antocianinas (de frutos vermelhos, por exemplo) ou sensações de adstringência e amargor em produtos ricos em taninos (vinho tinto, por exemplo). Este artigo resume alguns estudos sobre a interação de polissacarídeos com antocianinas e taninos de diferentes classes e estruturas, e que evidenciam a capacidade dos polissacarídeos para estabilizar, a nível molecular, a cor das antocianinas e modular as propriedades sensoriais dos taninos. No futuro é necessário confirmar se os resultados obtidos a nível da indústria alimentar são similares aos observados in vitro e desenvolver abordagens para, quando necessário, extrair polissacarídeos naturalmente presentes nas matérias-primas de forma mais eficiente por forma a usá-los para modularem as mesmas propriedades no produto alimentar final.


A quitosana é um polissacarídeo linear obtido a partir da desacetilação parcial da quitina, constituído maioritariamente por unidades de (β1,4)-2-amino-2-desoxi-d-glucose (d-glucosamina). A presença de grupos amino, que podem estar carregados positivamente, é uma característica deste polissacarídeo que lhe confere propriedades físicas, químicas e biológicas singulares. Assim, a quitosana, um polímero renovável, não-tóxico, biocompatível e biodegradável, tem sido estudada para formar filmes com propriedades antimicrobianas e antioxidantes. No entanto, o uso de filmes de quitosana para aplicações alimentares tem sido reduzido devido à sua solubilidade em meios ácidos aquosos e propriedades mecânicas limitadas (baixa resistência e flexibilidade). A modificação química da quitosana, nomeadamente por reticulação e/ou ligação de moléculas bioativas, tem sido usada para aumentar a sua funcionalidade de forma a ampliar as aplicações na indústria alimentar, nomeadamente no desenvolvimento de materiais para embalagens alimentares ativas e inteligentes para conservação de alimentos.

 


Os filmes e revestimentos comestíveis podem ser usados com diferentes funções. Na indústria alimentar eles têm sido usados principalmente na conservação de alimentos, como veículos para o transporte de compostos funcionais e na funcionalização de embalagens. A sua aplicação está relacionada com a sua capacidade de funcionar como uma barreira para gases, tais como vapor de água, oxigénio e etileno, com a possibilidade de incorporar na sua matriz compostos bioativos que desempenham uma determinada função no alimento ou quando ingeridos pelo consumidor; e pela possibilidade de envolver alimentos e assim possibilitar a embalagem individual dos mesmos. De todos os compostos utilizados, os polissacarídeos são os mais explorados devido ao grande número de possíveis aplicações, apresentando também uma grande versatilidade. Neste artigo são apresentados os principais compostos usados na produção de filmes e revestimentos comestíveis, sendo dada maior relevância aos que usam polissacarídeos como principal meio de produção. Além disso, são dados alguns exemplos de métodos de produção de filmes e revestimentos e possíveis aplicações, enfatizando a técnica camada-por-camada como uma forma de produzir revestimentos e filmes nanoestruturados. No final são apresentadas as perspetivas sobre o uso de revestimentos e filmes comestíveis e os principais tópicos que estarão em discussão no futuro.


Qualquer uma das nossas células é revestida por um complexo conjunto de hidratos de carbono, que lhe conferem uma identidade própria e modulam a sua função. Os hidratos de carbono decoram todas as proteínas membranares e secretadas, tendo uma posição privilegiada para mediar a interação entre células e moléculas. A resposta imunitária, tipificada por interações célula-célula e reconhecimento molecular, é o modelo ideal para compreender os eventos mediados por hidratos de carbono bem como a sua biologia. Assim surge o termo “Glicoimunologia” que estuda o papel dos hidratos de carbono no sistema imunitário, bem como na fisiopatologia das doenças relacionadas e na terapia. Neste artigo destacamos alguns exemplos do papel dos hidratos de carbono e das moléculas que os reconhecem nas diferentes funções de células e órgãos do sistema imunitário humano. Os hidratos de carbono influenciam os mecanismos que desencadeiam autoimunidade, imunodeficiência, infeção e outras doenças relacionadas com a resposta imunitária, como o cancro.  Assim, a “Glicoimunologia” alargou o nosso conhecimento em áreas muito abrangentes como as doenças do foro imunológico e permitiu o desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas.


Numa noite de outubro de 1962, vindo do edifício 19-20 em Portugal Place, Cambridge, Inglaterra, um local pacato com uma hélice dourada pendurada sobre a porta, o barulho alarmou a vizinhança – fogo de artifício, garrafas de champanhe e os risos estridentes de amigos em festa. Celebrava-se a outorga do Prémio Nobel da Fisiologia ou Medicina a Francis Crick, em partilha com James Watson e Maurice Wilkins, “pelas suas descobertas sobre a estrutura molecular dos ácidos nucleicos e o seu significado para a transferência de informação na matéria viva". Francis Crick gostava de desvendar segredos da vida, puzzles moleculares. O primeiro segredo estava revelado. Outros desafios se seguiram. Crick enfrentou o código genético, a relação do DNA e do RNA, entre si e com as proteínas, a sua química, bioquímica, biologia.

Ao longo da vida, Francis Crick interroga-se. Será possível criar vida no meio interestelar? E transportá-la através do espaço por mensagem inteligente? E que sabemos nós sobre a consciência humana? Neurobiologia. 

Francis Crick era especial. A sua inteligência, o seu vigor, o seu encanto intelectivo, a sua disciplina de pensamento explicam os resultados que ele obteve e os de muitos outros submetidos ao seu irritante questionar.

 

No início de 1774, entre fevereiro e março, as paredes do Laboratorio Chymico começaram a erguer-se. Foi centrada neste edifício que se desenvolveu a Química na Universidade de Coimbra, até vir a ser transferida para as novas instalações do Pólo I do Campus da Universidade na Rua Larga, em 1974. Neste percurso de 200 anos há períodos, quer no seu início quer já na segunda metade do século XX, intensamente estudados numa perspetiva histórica, moldada pelos contextos da época em termos europeus e em termos nacionais. Outros há menos estudados. É o caso do período secular de 1820 a 1930. De 1821 a 1840, Joaquim Franco Silva assume a direção do Laboratório Químico. Na sequência das Lutas Liberais de 1823 a 1834, a Universidade de Coimbra passa por grandes dificuldades, refletidas também no Laboratório Químico. Porém os seus professores procuraram cuidar do inventário em substâncias, instrumentos, bem como da biblioteca. Ao mesmo tempo procuraram acompanhar os progressos da química e integrá-los no Laboratório. A Reforma de 1844 veio dar maior importância à química do Curso Philosophico, que passa a integrar, pela primeira vez, algumas subdivisões da química: Química Inorgânica e Química Orgânica e Análise Química

 


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